domingo, 26 de setembro de 2021

Carta ao Adepto IV

 Para Walker

                      I

                  Hoje tive algumas reflexões políticas de manhã, fiquei as voltas em relação a que opinião adotar, a partir disso pensei bastante em relação a construção da Sociedade Fabiana. De novo cheguei a conclusão que seria melhor seguir sozinho, cheguei até a flertar um pouco com o pensamento do anarquismo individualista.

                    Voltei para meus afazeres, até chegar um ponto quando estava pesquisando sobre Dadaísmo e Surrealismo conheci um livro chamado Morning Star: surrealism, marxism, anarchism, situationism, utopia. No momento achei que fora um grande achado, só depois caiu a ficha que era tudo que precisava ter encontrado. Abriu mais uma vez a ideia de fazer uma pesquisa, de dedicar a um mestrado. 

                      Essa questão nasceu através de um longo processo de reflexão, não sei ao certo como organizar todo esse conteúdo aqui. Desde o ano passado venho tendo essa reflexão, com a criação da Sociedade Fabiana, tenho pensado na ideia de fazer um debate entre as diversas correntes do pensamento progressista, não centralizando em um única visão. Era uma possibilidade de experimentar todo tipo de pensamento, deixando a oportunidade até de se fixar em alguma leitura algum dia ou talvez não. Com a dissolução da sociedade, minha atenção saiu do coletivo para o individual, para mim mesmo.

                      Assumi isso como uma nova fase da Jornada do Herói. Na Sociedade havia uma busca por uma ordem, mesmo que não fosse o único ponto de vista a ser adotado. No meio desse processo me deparei com novas visões do anarquismo dados pelo Paul Goodman e também leituras do Situacionismo. Sabia que um dia podiam ser aproveitadas. Acabando a Sociedade, me voltei para meu trabalho como psicólogo. O ano de 2021 seria esse momento em que só daria atenção a isso, só poderia de fato ajudar a sociedade em volta pelo exercício da psicologia.

                         Até agora volto a esse questionamento, que se originou dentro da Sociedade: que perspectiva política adoto? A primeira resposta que me dei foi o livre-pensamento, o não comprometimento que nenhuma visão política em específico. Mas esse problema continuou a me incomodar, principalmente a partir dos acontecimentos recentes. 

                               II

                      Tendo em vista isso, ainda tento focar na única coisa que tenho uma relação mais íntima, que seria a psicologia. Não busco me arvorar a emitir opiniões fora desse campo, penso mais como outras leituras influenciam minha prática clínica e psicológica. Estudo a Gestalt-terapia, onde as referências são majoritariamente europeias ou americanas. Tendo em vista uma outra realidade espaço-temporal, cheguei a me questionar sobre a possibilidade de trazer para o contexto brasileiro do séc.XXI.

                       Não gostaria de cair na mesma interpretação comum a psicologia social feita no Brasil, gostaria de utilizar outro referencial, que condiz com ideias que venho tendo, que encontro na própria Gestalt-Terapia. Penso que o Movimento Antropofágico possa me trazer novas perspectivas de entender a realidade brasileira, que não caiam necessariamente numa leitura freiriana ou marxista. Almejo trazer a visão educacional e política de Goodman juntamente com as ideias do Situacionismo, assim criando uma relação direta com as vanguardas da primeira metade do séc.XX trazidas por Oswald de Andrade ao Brasil em seu Movimento Antropofágico. 

                       Entendo que posso encontrar essas leituras em três obras, Utopia Antropofágica, Morning Star: surrealism, marxism, anarchism, situationism, utopia, do Michael Löwy, A Ontologia Gestáltica de Paul Goodman, de Marcos Cézar Belmino. Ao meu olhar essas três obras prometeriam uma olhar totalmente renovado para uma série de questões. Uma saída para um perspectiva de maior autonomia, abrindo espaço para novas formas de ação, tendo vista uma ideia contemporizada e adequada a realidade brasileira. Unir então uma perspectiva estético-política para o exercício da prática psicológica seria de grande interesse, e definir qual perspectiva cabe melhor praticar.

                    


Carta ao Adepto III*

 


        Agora, há um novo passo a ser dado. Esse final de semana foi crucial para chegar em algumas conclusões que estavam para serem geradas. Percebo como cada passo é fundamental, como cada momento está criando meu entendimento de mundo. Não existe uma vida lá no futuro, mas a cada situação que se passa, criando experiências.

              Foi fundamental nesse fim de semana as aulas que tive com o professor Marcos Cézar Belmino, sobre Experiência de Campo. Essas aulas sanaram muitas dúvidas, me ajudaram a tecer uma nova compreensão de minha profissão e de filosofia de vida. Seria importante contextualizar isso tudo antes. 

                    Como já foi explanado, havia um conflito em mim entre duas partes, chamei essas duas partes de introversão e extroversão. Havia (ou há) a necessidade de enxergar essas duas instâncias como partes necessárias ao meu processo de individuação (Jung). Bem, depois da aula do fim de semana pude dar um passo à frente em relação a isso. A dúvida que até então estava tendo em relação, especificamente, a minha profissão, - e consequentemente a outras esferas de minha vida, -  era como é a relação terapeuta-cliente, como abordar o cliente. Diante das reflexões de Belmino, pude perceber minha tendência ao controle, a definição da experiência do outro, me afastando da minha própria. Ou seja, a relação terapeuta-cliente como uma análise gestáltica, se preocupa com o terreno da relação, não com o cliente em si, como indivíduo. Individualizar o cliente seria afastá-lo da experiência clínica, torná-lo controlável, diagnosticável.  

                          Assim, posso entender que a relação que tenho com o mundo não é partir de como julgo o mundo, mas como me relaciono com ele. Isso mudou completamente a minha forma de enxergar certas coisas. Meus conceitos, reflexões, interpretações caem facilmente por terra, porque não me permito experimentar, abrir o campo de possibilidades, assim acabo fechando as possibilidades, tornando a realidade algo acabado. Isso foi complementado com a experiência da festa na casa de Júlia esse fim de semana. Ali pude ver que a vida é muito mais rica do que meus conceitos, há muito mais coisas lá fora, possibilidades que eu não poderia imaginar ou fantasiar, existe algo acontecendo no mundo que não está relacionado com minha vida interna.

                            Porém, logo percebi que ali não era minha morada, teria que voltar a minha realidade. Já passei por isso várias vezes, de me divertir em um lugar e sentir pena por ter que voltar a mim mesmo. Na volta veio pensamentos, coisas que talvez estavam no fundo esperando para aparecer e serem vistas. A vergonha, o medo, sensação que aquilo tudo não passou de algo passageiro, de algo que não criou raízes, aquelas pessoas não são de fato pessoas que me nutrem, etc. Foi como voltar a consciência lúcida, como se eu estivesse tentando me distrair do peso da vida. Mas sei que foi muito necessário, não podia aguentar mais estar em casa, olhando para a mesma realidade de sempre, ter os mesmos pensamentos, sentir as mesmas coisas. Foi necessário explodir, foi necessário me pôr para fora, me colocar no mundo, gozar. 

                              Ao chegar em casa li um pouco do livro que peguei emprestado de Júlia. Me trouxe mais outras reflexões. Um livro de Foucault sobre a relação entre Nietzsche, Freud e Marx. Não foi o que estava esperando. De novo, a reflexão sobre a profundidade, sobre a interpretação da vida, sobre a falta de sentido ou a falta de origem para as nossas interpretações. Aqui não há mais necessidade para compreender o mundo, ele é incompreensível, não há um sentido fundante. Porém ainda se faz necessário interpretar. Daí recaio sempre num entendimento que existe algo por trás em tudo, preciso entender  o porque das coisas, as motivações internas para cada ação e acontecimento. Porém, não concebo a falta de motivação, ou minha própria incapacidade de compreender esse algo que motiva. O outro é sempre um exemplo para isso, nunca posso entender completamente o outro, o outro é sempre um estranho, é sempre um desvio. Essa é a base para uma perspectiva relacional, integrar o estranhamento na minha experiência, porque é aí que reside o novo. Porém, essa integração não se dá de forma arbitrária, passa por uma deliberação, por uma escolha, pela capacidade livre de aproximação ou distanciamento. Isso se sintetizou para mim claramente quando entendo que o outro não precisa se afeiçoar a mim, vice-e-versa. O outro é o que ele é, enquanto eu sou o que sou. A relação se dá nesse campo, nesse lugar que compartilhamos. Isso rompe com meu olhar que eu preciso conquistar o outro, que preciso decifrar o outro, para então, controlar. Eu sou livre, tanto quanto você é livre.

                    Isso talvez não seja uma forma de me dispensar de mim mesmo, de fazer esse salto indiscriminado para o outro, isso seria confluência. Mas, posso abrir a possibilidade para o compartilhar, sem também abrir mão do conflito. Não estou aqui tentando defender uma nova visão, uma nova ideologia, me desfiz dessa necessidade. O que impera agora é essa dinâmica figura-fundo, esse constante movimento com ambiente, que me modifica, que me faz crescer. Posso também chamar isso de processo de individuação, porque não?

                     

Carta ao Adepto V

                     Hoje de manhã borbulhou uma série de percepções sobre mim e minha realidade, transpus isso para o campo teórico, fiquei ansioso para poder escrever o que estava em minha mente. Basicamente sei que é uma questão que envolve uma diversidade de coisas e experiências, não posso utilizar uma única perspectiva.

                      Acordei bem cedo hoje, apesar da insônia terrível de ontem, não pude evitar, um episódio de turbulências, como sempre. Mas hoje foi fundamental acordar e sentir que nada havia, o nevoeiro se dispersou, então me coloquei a refletir. Mas agora percebo que não quis decifrar - no sentido de tentar de apenas racionalizar - o que aconteceu.  Percebo agora inclusive minha atitude reflexiva. Mas o que ocorre é que o que senti não podia ser facilmente controlado, era apenas algo que aconteceu, que o organismo pedia para acontecer. Ao tentar dormir, tive a necessidade de voltar ao normal, não queria mais confiar em minhas emoções, elas naquele ponto pareciam destrutivas. Consegui de certa forma me acalmar, mas foi de fato uma longa tentativa.

                       Naquele momento me senti abandonado, não só pelas pessoas, mas pelos deuses. Como poderia ter chegado a uma conclusão tão fundamental na semana passada, e agora estou nessa situação? Busco de todas maneiras compreender, buscar fazer sentido, buscar motivações. Porém tudo isso é insuficiente, há algo em nós ou na realidade que foge a razão, e simplesmente seguimos o curso das coisas.  

                         E agora, numa manhã de domingo estou escrevendo, sem a menor ideia do que o futuro me guarda. O medo que tinha, a ansiedade que tinha, a angústia que tinha, na verdade revelou minhas paranoias, minha necessidade de contato dependente, minha falta de confiança, em mim e na vida. Daí a revolta, querer sumir e não ser mais encontrado. Me resumi a auto-piedade. Mas a vida continua, não é tão confortável viver eternamente no fundo do poço. Deve-se sair, talvez com outra perspectiva.

                        O problema talvez esteja na confiança, no achar que não dará certo, que sempre tenderá ao erro, a falha, ao fracasso. Então retiro meu investimento, não quero me dar mal. Mas e agora? resta a dúvida e a incerteza, da mesma maneira. Se eu achei que encontraria segurança na atenção dos outros, e isso foi frustrado, pelo menos nesse momento, sei que existem outros lugares a serem explorados. Existe a autonomia. Ontem senti o peso da solidão, o peso de uma não confirmação do outro, porém agora estou livre desse julgo, porque não há mais outro. Pelo menos o outro como juiz. Gostaria de acreditar nisso, porém não há outra saída, ou eu sou eu, ou nada feito.

                         Daí vem aquelas pessoas  militantes da autenticidade a todo custo. Nossa sociedade não recebe bem as diferenças, isso é bem óbvio. Agora vejo um lugar que não foi ainda explorado, o meu próprio.  Tentam reprimir, desvalorar, diminuir minha potência. Meu ímpeto rebelde. Bem, ele está aí, ainda. Talvez não conseguirei me desvencilhar dele, o que faço é integrar. Tinha receio de ninguém ver meu sofrimento, de ser esquecido, bem, qual é o problema real disso? Existe sim uma dependência aí, não aguento estar sozinho, de sentir que ninguém se importa na verdade. Então eu tenho que fingir um sorriso amigável? Como fiz na faculdade? Agora de novo quero apressar esse processo, buscando uma resposta.

                          O importante que estou aqui, estou falando sobre isso, existe alguma efervescência. Não gostaria de cair de novo nesse buraco, pelo menos não agora. Não sinto especial tensão, estou tranquilo, isso que importa. Os pássaros cantam, sinto uma certa paz. Não há muito a pensar. Ontem em algum momento percebi o como eu não estava de fato vivendo a minha vida, estava me projetando para fora o tempo todo, não sabia ocupar meu próprio corpo. São múltiplas atividades, distraindo minha atenção, não permitindo olhar para mim mesmo. Então as emoções, que surgiram como uma avalanche. Não quero ser bem comportado, não quero estar nesse lugar de opressão (Vejo de certa forma meu Édipo aí). Esse lugar de dependência, seja da opinião alheia, ou de minha própria noção de civilidade. As coisas tomam outro rumo, e é isso.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

A Mãe

 

                                

                        Essa imagem surgiu para mim esse fim de semana passado, na aula de Arteterapia. Já faz algum que foi concebida, e acredito que foi de grande importância para o momento que estou vivendo. Aparentemente foi gestada por um longo período, e apareceu desorganizando ou reorganizando vários padrões que tinha estabelecido recentemente. A primeira impressão que tive com a imagem talvez foi a sensação de distanciamento, pois é uma figura antiga, também por ser uma figura nobre, tinha acreditado que era uma deusa, mas agora sei que é uma rainha (Nefertiti especificamente).   

                       Observando com mais cuidado logo aparece o fato de ser uma mãe, ela está cuidando de seus filhos. Percebe-se então não só um distanciamento mas também um figura destinada ao cuidado. Então, compreendo a ambivalência dessa imagem. Uma figura distante, quase intocada, de grande poder, tanto material como espiritual, porém também aquela que está lá para cuidar e atender. Essa imagem me trás uma complexidade de informações, que mal consegui reter isso tudo que ela me disse naquele momento, e ainda estou intrigado por ela.

                         Essa figura apareceu para mim como uma mensagem de paciência e calma, primeiramente como algo que permiti o cuidado, o afeto necessário para o crescimento do ser, a atenção necessária para compreensão da vida e do mundo, porém ela estabelece uma distinção entre ela e eu. Ela é a Mãe, ela é a figura divina que está acima de minha humanidade defeituosa, com isso aponta para o futuro, demonstrando a necessidade da continuação do processo, da perseverança. Por isso não posso estabelecer um contato direto com ela, de forma estranha existe uma energia de consolo, porém com um misto de uma certa indiferença, que me chama para o crescimento, experiência muito próxima a última imaginação ativa que tive.

                               Daí chego a um entendimento do lugar em que estou. Não há um lugar estabelecido, ainda estou num processo árduo de preparar minha jornada, não tenho como parar esse processo, não tenho como me estagnar, preciso dar continuidade. Porém com a noção que não estou sozinho, que estou acompanhado, que obtenho ajuda, sabendo assim que não estou completamente independente, há uma força por trás das minhas ações, sentimentos e pensamentos. Essa energia que agora atua sobre mim é uma energia feminina, ou seja, não é mais no impulso agressivo que conquistarei as coisas, mas na confiança no processo natural das coisas, na paciência que constituirá minha ação no mundo, não mais nos extremos de uma  conquista impetuosa ou um isolamento reflexivo, mas na contemplação dos acontecimentos, no livre fluir das coisas que me levaram a uma vivência mais simples da vida, menos apegada e compreensiva. Agora tenho um entendimento melhor disso, saber o momento para cada coisa, sabendo que não preciso forçar nada.

                              Para além disso tudo deveria louvar a parte feminina de mim mesmo e também as figuras femininas em minha vida, entendendo que papel elas ocupam. Hoje mesmo de manhã Elizabeth me falou sobre a necessidade de desapegar da ideia de estar certo, isso para mim foi muito coincidente com a experiência do cartão. Percebo que minha relação com o meu masculino foi sempre exacerbada em detrimento da parte feminina que ficou inconsciente, por isso projeto facilmente no objeto feminino algo meu. 

                                    Para finalizar, penso em continuar essa leitura sobre o Arquétipo feminino em outras postagens, vou dedicar as quintas para ler o livro A Grande Mãe de Erich Neumann, e traz talvez mais algumas informações. Sentirei um pouco como processo irá se desenrolar.


quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Carta ao adepto II

     Depois da primeira Carta, não houve uma resposta. Então decidi continuar com esse dialogo, porém com uma figura imaginária, não pretendo escrever as respostas, só as minhas reflexões como se estivesse endereçando a outra pessoa.

    

        Hoje de manhã me veio outro tipo de reflexão. Hoje é 7 de Setembro, dia da Independência. Independente de qualquer acontecimento político do dia de hoje, volto aos meu próprios pensamentos, a minha reflexão pessoal, sobre o que considero necessário para meu entendimento do mundo e de mim mesmo.

           Diferentemente da última Carta, não quero buscar na psicologia as respostas mas na filosofia, na compreensão da ação e pensamento do homem. Nisso, o nome de Schopenhauer vem à tona. Me pergunto o porquê de estar lendo Schopenhauer justamente nesse momento. Basicamente é um livro que não exigirá muito de mim, mas tenho a ambição de retirar algumas reflexões necessárias. 

             Logo de cara, vejo uma reflexão necessária a um contexto da Alemanha do séc.XIX, sei que hoje existem outras questões a se preocupar, porém acredito que o cerne do problema é o mesmo. Agora penso que um professor meu diria para tentar entender o contexto dessa reflexão. Sim, sinto que existe uma certa escassez de entendimento do pensamento alemão daquela época. Porém, rapidamente pude assimilar certas ideias essenciais.

             Existe um descontentamento diante do pensamento intelectual dessa época por parte do autor, e posso enxergar nitidamente essa mesma questão nos tempos atuais, porém com outras cores. Me identifico de certa forma com Schopenhauer, da mesma maneira com Jung e Nietzsche, agora mais recentemente com Goodman. Porém, essa aproximação quase que instantânea com esses outsiders pode ser facilmente minada pela brutalidade das instituições. Eu claramente nesses dias declarei para mim mesmo minha independência diante do pensamento político comum, de forma muito instintiva. Correndo o risco de soar egoísta e alienado, todavia para mim o sentimento  de não pertencimento é grande.

               Acredito que Schopenhauer critica essa adaptação forçada ao pensamento comum, que muitas vezes é pobre e vazio, incapaz de criar algo novo, algo de real importância. Em pouco tempo identifico nessa escrita um chamado para o pensamento independente, que não almeja cargos. É a busca mais sincera e honesta do sujeito rumo à verdade. Primeira vez que consegui encontrar uma legitimação do que eu sinto, abraçar a paixão por algo não pelo que esse algo pode me dar de lucro, mas pela descoberta.

                   Venho sentindo um vazio na mentalidade das pessoas, a nossa tendência à neurose, a nossa tendência à aceitação passiva das coisas, uma alienação de nós mesmos em prol de um pensamento já instituído. Descobri hoje que o papel da Sociedade Fabiana justamente é essa potência, o seu legado foi a capacidade de pensar por si, descobrir a verdade por si só, não pela mente do outro. Será que estou sendo fanático pensando assim?

                     Minha intuição me diz que não posso me render facilmente, não posso também me preocupar demasiado na visão do outro sobre mim, se sou digno de admiração ou não. De novo a imagem do Eremita, do monge. Será que isso surge concretizado diante de mim na forma de Schopenhauer? Eu assimilo essa possibilidade. Agora ao meu ver existe um contraste, nesse momento específico. Os nomes que citei acima todos de certa forma foram produtos de uma época e de uma cultura. Uma figura que se destaca agora é justamente o do Goodman. Apesar de um rebelde, de uma ovelha desgarrada, é um produto de um período contemporâneo, uma figura pré-pós-moderna. Talvez existe aí um risco dos pecados da civilização ocidental do séc.XX, também talvez possa guardar algo de saudável. Quando vi o video sobre Nietzsche relacionando as três mente fundamentais (Rousseau, Goethe e Schopenhauer), me veio uma necessidade de voltar a um origem de pensamento, uma raiz que guarda uma vitalidade necessária, enquanto o pensamento contemporâneo pode ter essa falta de vitalidade. Para mim a Sociedade Fabiana servia para essas duas questões: um resgate de um espírito e também uma abertura para o novo, não se limitando a uma conservação de uma forma. 

            A leitura do Gestalt-Terapia de fato é a minha principal leitura, estou aprendendo bastante com ela, porém me preocupo em me relacionar somente com a mentalidade contemporânea.  De volta ao conflito com a personalidade extrovertida, pude perceber uma aceitação (mesmo que parcial) para o mundo externo, não uma aceitação como forma de adesão, mas um ajustamento criativo, o exercício da função intuitiva através da extroversão. Daí a possibilidade de contato, de participação no mundo, porém, justamente com isso o receio da massa, da participação no rebanho, na introjeção de preconceitos, a alienação de mim mesmo (que também conto com essa possibilidade em meu isolamento). 

                   Importante então contar com a descoberta, a digestão dos diversos pontos de vistas, não uma adesão a uma bandeira, me volto ao livre-pensamento. Não faço parte de um grupo, não tenho uma ideologia clara, não sei ao certo se preciso ter uma. Percebo no campo social essa dispersão, essa falta de coesão, mas também a necessidade de coesão através de valores externos me dá medo, não é o que almejo para mim nesse momento. Apenas observo os acontecimentos e crio a partir das minhas próprias referências.

 

 

 

quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Carta ao adepto I

 

      Olá, estou muito animado por essa troca. Antes de tudo irei explicar rapidamente o porquê do título. Venho escrevendo semanalmente sobre diversas ideias e experiências pessoais, e tive a ideia de mandar emails para pessoas conhecidas sobre leituras e reflexões que venho tendo. Bem, acabou não acontecendo, então pensei em fazer essa mesma escrita só que para uma pessoa inexistente, para sanar essa necessidade de colocar essas ideias num dialogo imaginário. O adepto séria justamente essa pessoa imaginária que iria me corresponder, agora adepto pode ser qualquer pessoa que eu construiria esse dialogo via email.
     
    Gostaria, então, de começar a partir de algumas coisas que venho me deparando diante do assunto da psicologia, gostaria de incluí-lo nessa reflexão. Isso envolve tanto reflexão que me deparo em minha própria quanto nas minhas leituras cotidianas.
    Essa reflexão se iniciou a partir de um conflito constante no dado momento, que seria o conflito entre instâncias extrovertidas e introvertidas presentes em minha vida. Duas partes contraditórias que me trazem valores diferentes, perspectivas diferentes, etc. Acredito que a experiência da pandemia me levou a isso. Há um claro contraste da minha vivência na faculdade, que ao meu ver foi majoritariamente extrovertida, com a minha existência anterior a faculdade, que foi majoritariamente introvertida. Agora na pandemia me deparei com esses dois mundos, um mundo novo que me obriga a voltar a convivência de mim mesmo junto a aprendizagem que tive nos recentes anos.
      Então, posso trazer dois pontos de vistas que me colocam nesse problema. O ponto de vista da Gestalt-Terapia, teoria que só me dei conta da existência na faculdade e Jung, interesse que antecedia a faculdade. (Não irei falar os detalhes que me levaram a essas duas teorias, a menção a elas por enquanto já é suficiente).
      Pois bem, hoje venho entrando em conflito com aspectos da minha personalidade que me trazem para a experiência presente do mundo (Gestalt-Terapia) e outro aspecto que me leva a refletir sobre questões profundas de minha vida, buscando dados em minha interioridade (Jung). Essa contradição tem feito uma grande confusão em mim.
       Com a leitura presente da Gestalt-Terapia, chego a reflexão da Teoria do Self de Paul Goodman. Com isso o entendimento da neurose. Para a GT neurose significa um enrijecimento na personalidade, onde o sujeito não conseguiu solucionar um problema passado, assim sua necessidade não é satisfeita, impossibilitando-o de assimilar o novo. Ou seja, o neurótico é incapaz de experienciar o mundo, é um sujeito preso em sua interioridade, distancia-se da realidade externa, criando uma personalidade distinta. Não consegue assim se satisfazer por não haver possibilidade de um dialogo amistoso com o ambiente. Ideia muito semelhante presente na teoria reichiana.
        Esse conceito de neurose qu vem me perseguindo ultimamente. Venho sentindo uma grande nostalgia do passado e pouca tolerância ao presente. A existência no atual momento vem sendo muito dolorosa, os aspectos políticos e sanitários, as incertezas em relação ao futuro, a perda daquilo que até então me estimulava, um estranho processo de amadurecimento. Então existe também uma necessidade de busca de sentido, buscar os porquês desse momento, o que nos leva aos acontecimentos atuais, quais motivações internas para tudo.
       Fiz uma viagem recente para Gravatá, e todas essas questões estavam presentes. Faço o cálculo que vou a essa casa mais de 15 anos e penso o que mudou. O que há de novo? Ou estou vivendo a mesma realidade de sempre? sem nenhuma novidade, tudo já passou e não há nenhum estímulo novo, nenhuma tendência, tudo foi desgastado.
        Voltei para a casa com essa sensação, que tudo é uma repetição do passado, só que agora sem vitalidade nenhuma. Também venho pensando sobre a falta de uma identidade, de defender um ponto de vista, me disciplinar dentro de uma ideologia ou credo. Mas todas  tentativas passadas e futuras foram infrutíferas. Agora só há o vácuo, a existência constante sem nome, sem identidade. Um barco vazio.
        Agora me deparei com um texto de Jung muito revelador que queria compartilhar. Aqui Jung fala sobre a necessidade dos opostos, como nossa natureza humana é essencialmente constituída através dos opostos. Me lembro em seu Tipos psicológicos o fator do sacrifício como função de compensação. Jung revela que as mudanças na vida nos trazem a necessidade de defender novos valores, porém aí existe um perigo, o sujeito acredita que aquilo que é novo é a pura verdade, assim julga aquilo que antigo como errado, como ultrapassado. Ele diz que o sintoma resultante disso é o enrijecimento, o dogmatismo. Porém o aceitação das contradições nos leva a insegurança. Talvez justamente essa sensação de estar presente dentro de si duas pessoas distintas. A incapacidade de solucionar esse conflito nos leva justamente a regressão, a uma busca pelo passado. Porém, aquilo que funcionava no passado já não funciona mais no presente.
        Gostaria de talvez deixar aí essa questão, provavelmente me depararei com novas leituras e reflexões. Gostaria de continuar essa conversa, você pode adicionar seus pensamentos e as coisas que vem refletindo.

Abraços fraternos

Reflexões sobre "Cuidando do Cuidador"

      Esse fim-de-semana houve um evento do meu curso chamado "Cuidando do Cuidador". Fiquei um pouco reticente sobre isso, eu ter...